27 de ago. de 2010

O Santa Cruz F.C. tem que voltar ao seu lugar

>> Nada mais preciso que o aforismo “a vida é uma gangorra”. Diante dele só há uma constatação óbvia e ululante: é. Regresse comigo ao longínquo início dos anos 1930. A cidade é São Paulo. Não se falará aqui da resistência dos paulistas ao regime de Getúlio Vargas naquela que ficou conhecida como Revolução Constitucionalista (em 1932) que, massacrada, marcou a aurora da ditadura varguista. A coluna é sobre futebol, não sobre política.

>> São Paulo, 1930: fundava-se na provinciana capital paulista um time de futebol chamado São Paulo da Floresta. Abreviando a história, o clube virou o que hoje é a potência sediada no Morumbi. Uma equipe que é sinônimo de glórias — hexacampeã brasileira, tricampeã da Libertadores, tricampeã mundial. Desde o início, o São Paulo adotou o padrão tricolor — vermelho, branco e preto — e modelos de camisa idênticos aos do Santa Cruz, do Recife.

>> Recife, 1930: o Santa Cruz, clube fundado em 1914 na cosmopolita capital pernambucana, já se constituía então em potência regional. Fora o primeiro time do Norte e Nordeste do Brasil a vencer, ainda antes dos anos 1920, um embate contra um clube do Rio de Janeiro — em 1917, Santa 3, Botafogo 2, na capital fluminense. Grande campeão de todos os campeonatos regionais do Nordeste, era o terror de Sport e de Náutico, rivais na prática do esporte bretão no Recife.

>> Seguiram os anos, correram em paralelo as biografias esportivas de Santa Cruz e São Paulo. A partir dos anos 1970, os tricolores paulistas se descolaram do espelho pernambucano. Os são-paulinos construíram, a partir daí, a tal trajetória gloriosa de que falei. O Santa viveu o apogeu de 1975 a 1980, anos em que figurou ininterruptamente nas oito primeiras posições do Campeonato Brasileiro. Era um clube nordestino que tinha agenda de amistosos no exterior. Recebia seleções europeias para jogos no Estádio do Arruda. Em 1979, por exemplo, derrotou a Tchecoslováquia por 4 x 0, no Recife. Detalhe: os tchecos eram os campeões da Eurocopa.

>> Neste século, a linhas biográficas de Santa Cruz e São Paulo descreveram um “x” típico de pesquisa eleitoralDilma x Serra. Um passou pelo outro e tomou distância abrindo o que em análise de pesquisa se denomina popularmente “boca do jacaré”. O tricolor pernambucano caiu ao rés do chão — disputa a Série D em 2010 — e o tricolor paulista foi três vezes campeão brasileiro, conquistou mais uma Libertadores e o tri mundial.

>> O São Paulo parecia imbatível. Olhava com desdém para o coirmão do Recife, de quem um dia copiou as cores e o padrão. Até Hernanes, maior craque formado no Morumbi nesta década, pernambucano de Caruaru, preferiu bater às portas do CT são-paulino a ir ao carcomido Ninho da Cobra, do Santa, onde um dia foram formados craques como Rivaldo, Ricardo Rocha, Nunes, Carlos Alberto Barbosa e Givanildo.

>> Eis que, nos últimos 10 dias, o jacaré parece estar fechando a bocarra e o São Paulo ameaça cruzar de novo a trajetória biográfica do Santa. Ou não é isso que se depreende de um clube que teve dois técnicos e um interino em apenas seis meses, tem torcedores uniformizados atrapalhando seus treinos e fustigando o elenco, perde os jogos mais fáceis e é incapaz de ganhar um clássico?

>> O São Paulo caminha a passos largos para a Série B. O Santa, graças a Deus, deve conseguir ascender à Série C. Quem sabe o alfabeto do futebol não os reuna de novo em 2012 numa competição oficial? Esforço para isso parece não faltar no Morumbi.

Luís Costa Pinto escreve às sextas-feiras no Super Esportes

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